Quinta-feira, 25 de Março de 2004
A estranha palavra ou os sinais imprevisíveis
Usara aquela palavra a despropósito.
Sempre designara assim certas coisas desde que se lembrava.
E nunca percebera porquê, como se isso pudesse ser percebido.
Naquele dia, desmanchava a tenda, depois de uma feira de cem anos.
Abriu até pela primeira vez em mais de meio século, uma certa porta.
Viu o azul celeste debaixo do amarelo, debaixo do cinzento, debaixo do branco, nas camadas de cal.
Fosse para onde fosse que demorasse o olhar, sentia a alma da casa a ranger.
Era a ele que cabia fechar as portas, à quarta geração.
Nesse momento, a sua ama entrou-lhe pela porta. Não a via há alguns anos.
Como se os sinais se houvessem de se juntar teimosamente, ouviu-a na outra ponta dos dois quartos, feitos um, feito espaço público, murmurar:
As voltas que eu dei para perceber porquê...
E ali mesmo, revelou o segredo, quarenta anos depois.